Prioridades, sozinha ou não.


– Não me deixe! – gritei, eu. Ele me olhou com aquele olhar que dizia “Não seja histérica!”, Palavra que odeio, essa tal de histeria.

Ele odiava que os vizinhos nos escutasse e momento ou outro me dizia “Vamos nos mudar para uma casa com garagem e jardim.” E eu sorria, acenava e pensava “Para que? Morar em apartamento atendia todas nossas necessidades”. Ele resmungava que meu sorriso era paternalista.

– Não vá! – Gritei chorosa. Juntei minha saias longas com uma mão e joguei o cigarro fora. Tentei correr até ele.

A briga começou porque eu estava fumando perto dele. Estávamos na sala, se não pudesse fumar na sala, onde mais eu fumaria? Na cozinha?

Ele pegou a mala e veio para meu lado com um olhar fumegante.

– Não grite, Lourdes! Já não basta se envergonhar? Quer me fazer passar por esse vexame? – Seu perfume me cercou.

– Então não vá embora! Só por um cigarro?

– Um cigarro? Um? Eu já fui embora há tempos! Não percebe? Só ouve sua própria voz? Só aceita seus próprios sentimentos?

Enquanto ele falava eu olhava para seu rosto quadrado, os olhos escuros, os cílios espessos, a sobrancelha arqueada, os lábios finos, as bochechas sombreadas por barba amanhecia. O cheiro de homem.

– Não está me ouvindo, está? – Não esperou resposta, se virou e se foi.

E eu chorei. Ele nunca se foi antes.

Ele ia de outra forma, olhares de esguelha. Dormir de costas para mim. Jantar em silêncio. Educado, como um estranho, “Obrigado, por favor, com licença”.

Agora se foi.

E eu gritei.

Os vizinhos reclamaram.

E eu gritei mais.

Eu gritei e berrei e me joguei ao chão.

Tirei a saia. Puxei a blusa.

Tomei um banho.

Chorei.

Ele se foi e ficou apenas eu.

Meu pesadelo.

Sozinha, cercada por solidão.

“Eu já fui embora há tempos! Não percebe? Só ouve sua própria voz? Só aceita seus próprios sentimentos?” E os lábios dele se mexia e eu não o escutava.

Me lembrei de uma frase que ele sempre me dizia, “Egoístas devem viver sozinhos”. Seus olhos escuros me perfuravam, até que se escondiam por trás dos cílios espessos.

Sozinha na sala, eu fumei.

Eu realmente sou egoísta? Ou apenas uma desculpa para se livrar de mim.

Seria uma desculpa, de não me amar como me amo, digo, o amo?


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